JOSEMAR RABELO, SEM ÓDIO E SEM MEDO

JOSEMAR RABELO, SEM ÓDIO E SEM MEDO

terça-feira, 28 de setembro de 2010

POESIAS ; O PREÇO DE UM PÃO ROUBADO E SOU MATUTO

O preço de um pão roubado
(Welton Melo)

Sou um negro, doutor; sou só um negro
Cuja vida deu rumo distorcido
E apesar de dispor dessa aparência
Acredite doutor não sou bandido.
Eu conheço da vida os cativeiros
Sou mais um dentre tantos brasileiros
Que pernoitam na rua e esmolam um pão
Meu destino doutor foi infeliz
Fui forçado a fazer o que não quis
E fui taxado na rua de ladrão

Fui na frente de todos humilhado
Algemado igualmente a um bandido
Entre socos, tabefes, pontapés...
Por PMs doutor eu fui detido
E por ser mais um filho da pobreza
Me negaram o direito de defesa
E impuseram que eu próprio me calasse
Quando eu fui explicar por que roubei
Fui ao chão com um tabefe que levei
Que chegou a cortar a minha face

Me trouxeram pra cá e aqui estou
Vim aqui pra prestar depoimento
Por um erro que eu mesmo cometi
porem nunca neguei um só momento
Se o senhor como eu já for um pai
Tenho toda certeza de que vai
Entender o porquê que pratiquei
Fui errado doutor não vou negar
Mas um pai que tivesse em meu lugar
Roubaria do jeito que eu roubei

Vi meu filho de fome passar mal
Me dizendo:Papai quero comer!
Eu senti-me impotente seu doutor
Vendo aquilo sem ter o que fazer
Levantei-me dali, pedi esmola
Mas o povo ao passar nem dava bola
Planejei em por fim na própria vida
Me senti como um trem fora do trilho
Pois não tem dor maior que ver um filho
Te implorar por um prato de comida

Quando vi o meu filho agonizando
Aumentou inda mais minha agonia
Sem pensar levantei-me seu doutor
E correndo eu entrei na padaria
De nervoso suo lavava a mão
Vi os pães que ficavam no balcão
E lembrei do meu filho já morrendo
Me senti como ave em cativeiro
E num ato total de desespero
Dei de garra do pão ,sai correndo

Apesar de correr já era tarde
Vi meu filho sem vida ali no chão
Abracei o seu corpo pequenino
Foi ai que ouvi voz de prisão
E o que houve depois eu já falei
Me humilharam bastante,apanhei
E agora me encontro nesse estado
Só o senhor põe um fim nesta novela
Ou me tira pra sempre desta sela
Ou me deixa pagando um pão roubado

As algemas que prendem minha mão
Ferem a honra de alguém trabalhador
Que nem mesmo o senhor me libertando
Vai poder reparar toda essa dor
Mas doutor com a sua competência
Por favor ponha a mão na consciência
E se possível me livre desta teia
O caráter de alguém não se converte
Se achar que estou certo me liberte
Do contrario me deixe na cadeia 

(Sim senho! Eu sou matuto)
Welton Melo

Sim senhor seu doutor!sou um matuto.
Eu não sou descendente de burguês
O meu pai foi cabôco,cabra bruto
Que se quer dominava o português
Minha mãe zeladora da palhoça
Que findando o serviço ia pra roça
Pra cuidar com papai da plantação
No caminho eu ainda bem moleque
Caminhava com um par de currulepe
Que as pegadas ficavam pelo chão

Quando alguém me pergunta donde vim
E percebo algum AR de ironia
Eu respondo pra o cabra mermo assim:
-Eu nasci La na terra da poesia
Sou um filho fiel do Pajéu
La da terra de Jó, Zeze Lulu
E do grande poeta Lourival
Me desculpe seu moço a expressão
Mas não troco metade dum Sertão
Em quarenta ou cinqüenta capital

Eu num sei Cuma é que inda tem gente
Que esconde a origem donde veio
Desse povo nasci tão diferente
Pois me orgulho das coisas do meu meio
Pro senhor seu doutor ter a idéia
Se alguém perguntar numa platéia:
- tem alguém nesse mei que é do sertão?
A pergunta me serve como um hino
E pode ter uns 70 nordestino
Mas eu sou o primeiro a dar com a mão

Sou assim seu doutor,sou livro aberto
Minha história ta ai pra o povo ler
Quem quiser perguntar Chegue pra perto
Me pergunte que eu posso responder
Me criei com cuscuz,com rapadura
Vim aqui pra mostrar minha cultura
Pra o povo que mora na cidade
Sou matuto, doutor mas sou feliz
Porque planta que cresce sem raiz
Não resiste a primeira tempestade