JOSEMAR RABELO, SEM ÓDIO E SEM MEDO

JOSEMAR RABELO, SEM ÓDIO E SEM MEDO

domingo, 29 de agosto de 2010

VERSOS DO POETA GONGA MONTEIRO

O CEGO E O GUIA




Um compadre meu um dia

Contou-me um caso engraçado

Dum ceguinho que pedia

Na calçada do mercado.

Passava o dia pedindo,

O povo entrando e saindo,

Quand'um não dava outro dava.

E ele, nos louvores seus,

Dizia: “graças a Deus!”

Quando uma esmola ganhava.



Mais ou menos meio dia,

O sol quente feito brasa,

As esmolas recolhia

Pra levar tudo pra casa.

Dava um assovio fino,

Aí chegava um menino

Que eu não sei donde saía

E, alguns minutos depois,

Dividia o saco em dois,

Um pra ele, outro pro guia.



Nos sacos tinha de tudo:

Milho, farinha, feijão,

Doce pequeno e graúdo,

Biscoito, bolacha e pão,

Manga, laranja, banana,

Uma garrafa de cana,

Não que o povo tenha dado;

É que o cego cachaceiro,

Depois que conta o dinheiro

Compra a cana no mercado.



Mas deixe a cana de lado,

Nenhum crime nisso eu vejo.

Na saída do Mercado

Ganharam um taco de queijo.

E o guia falou: “Ceguinho,

Quando chegar no caminho

Esse queijo a gente come?”

E o cego, de voz maneira:

“Na sombra da ingazeira

Vamos matar nossa fome.”



O guia era uma beleza:

Desenrolado e ladrão.

Se o patrão desse moleza

Ele roubava o patrão...

E como o patrão não via,

Foi então aí que o guia

Deu uma de espertinho,

Enganando o pobre cego,

Tirando o bucho do prego,

Comendo o queijo sozinho.



Chegando no pé de ingá,

Botaram os sacos no chão

E o ceguinho disse: “Vá,

Desamarre o matulão...

Tire esse queijo pra fora

Que eu acho que está na hora

De alimentar a matéria:

Você se fortificar

E eu também quero tirar

A barriga da miséria.”



O condenado do guia,

Se fazendo de inocente,

Virava o saco e dizia

Ao patrão deficiente:

“Pode ter acontecido

Desse queijo ter caído...”

E o cego, contrariado,

Ao sujeito respondia:

“Como é que o queijo caía

Se o saco estava amarrado?



Deixe de senvergonheza!

Conte o que aconteceu,

Que eu tenho quase certeza

Que foi você quem comeu!

Eu tava desconfiado

Que você vinha calado

Desde o centro da cidade...

Cabra da vergonha pouca,

Deixe eu cheirar sua boca

Que a gente sabe a verdade...



Aí o pobre do guia

Ficou sem jeito e sem clima,

Sem saber o que faria.

Pra dar a volta por cima...

Tirou a roupa ligeiro,

Colocou o “fevereiro”

Assim de boca pro ar

E cochichou em voz rouca:

“Tá aqui a minha boca,

Se quiser pode cheirar...”



O cego botou a venta

No fê-o-fó do rapaz,

Disse: “Eita coisa nojenta!

Tu tás fedendo demais!”

Depois disse assim: “Menino,

Eu a ninguém recrimino,

Cada um faz o que gosta.

Você não comeu meu queijo,

Mas pelo jeito que eu “vejo”,

Meu “fi” tá comendo é bosta!...”

Nenhum comentário:

Postar um comentário